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22 de março de 2012

Um mendigo enfurecido passava pela Rua Mariz e Barros

Bruno Alves
Fotos de Apollo Natali na coluna Desabafos de um Ancião
Um mendigo enfurecido passava pela Rua Mariz e Barros em frente ao Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro quando – ao contemplar o prédio antigo – acalmou-se, e sentiu uma vontade irresistível de entrar. Mas como poderia passar pelos seguranças sem ser notado? Sorte que, em sua bolsa, havia uma blusa e calças limpas que havia ganhado há poucas horas. Finalmente , encontrava utilidade para o presente. Dirigiu-se ao posto de gasolina mais próximo e pediu para utilizar o banheiro. Um dos frentistas, mesmo receoso, permitiu que ele entrasse. Lá conseguiu um sabonete velho, o que colaborou para amenizar o seu mau cheiro. Agradeceu ao frentista e voltou ao antigo prédio.
O horário, o mendigo não sabia ao certo, mas acreditava ser por volta das quatorze horas. Disfarçadamente conseguiu entrar no ISERJ sem ser visto e foi impulsionado até a biblioteca. Quando entrou ficou surpreso com a figura de uma mulher fixada na parede, e aproximou-se dela. Tinha a sensação de conhecê-la há muito tempo. Começou a balbuciar algumas palavras como num profundo transe: “Teu canto é perdido, pássaro da lua...”. Lembrou o nome do poema, "Pequena Canção", do livro Viagem Vaga Música de Cecília Meireles, a mesma mulher que o sondava profundamente e que estava presa na moldura envelhecida. Cecília era sua companhia de horas e horas de deleite em noites chuvosas. Naquele momento, resgatou a sua memória perdida.
O seu nome era Antônio Maciel de Medeiros, um homem erudito, apreciador da renomada poetisa. Cursou Letras na antiga Universidade do Brasil, atualmente UFRJ, e doutorou-se na mesma instituição em Poética. Ele era pai de João Gabriel e esposo da pediatra Marisa Montenegro que desafortunadamente haviam falecido num trágico acidente de carro no Flamengo, o que levou Antônio à loucura. Quanta angústia e sofrimento! Por um instante ele quis correr, gritar e voltar a ser aquele velho mendigo, imune ao sofrimento da perda. Mas Cecília convidou-o ao recomeço. Através do olhar da fotografia, ele pode ver um filme que contava a história do Instituto de Educação. Sentiu que Cecília queria fazer-lhe uma revelação.
Viu que na inauguração do Instituto estavam presentes Dom Pedro II e a imperatriz Teresa Cristina, surpreendeu-se ao saber que a escola começou funcionando no Colégio Pedro II e que somente em 1930 passou a funcionar no prédio atual. A cada cena uma surpresa diferente. Descobriu que Anísio Teixeira foi o primeiro diretor da instituição e que Heloísa Marinho, Evanildo Bechara, Sérgio Buarque de Holanda e inclusive ele – para o seu espanto – tinham sido professores da renomada escola.
Ainda em transe, Antônio foi abordado por um dos seguranças da instituição, mas conseguiu sair do Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro ileso. Sabia que aquele encontro havia mudado a sua vida, mas o que fazer? Por onde começar? Seguiu rumo ao tempo, a fim de resgatar o que a vida havia lhe usurpado. Precisava recomeçar, por mais difícil que fosse. Encontrou uma pessoa que lhe estendeu a mão.
Hoje Antônio trabalha como voluntário em uma ONG, com alfabetização de Jovens e Adultos, além de ter conhecido Marisa, a mulher que vem tornando os seus dias mais felizes.

3 comentários:

  1. cristina maria ramos22 de março de 2012 às 19:30

    Bruno e Bia:
    Estou muito emocionada com essa história. O que não é a loucura, essa que por vezes percebemos seu liame com a sanidade. Antonio reencontrou seu passado e a visita ao ISERJ foi seu passaporte para rever-se, talvez, com menos sofrimento. Como você soube dessa história, Bruno?

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  2. Professora Cristina, não sei como o conheci! O que eu sei, é que ele chegou de mansinho em meus pensamentos e pediu para ganhar vida própria. Obrigado pelo comentário e carinho de sempre, agradeço também a pessoa anônima e a professora Bia que gerencia o blog.
    Bruno Alves - ISERJ

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