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11 de julho de 2011

As forças centrípetas da cidade

          Relendo um trecho da entrevista de Milton Santos, em 1999, à Revista Teoria e Debate, da Fundação Abramo (leia a íntegra da entrevista aqui), fica-se entusiasmado com o "espírito transformador" que uma cidade pode ter. 
          Ao responder sobre a diferença entre o campo e a cidade, ele alerta para a "esquizofrenia do território", mas também reconhece que há maior vulnerabilidade no campo. Não por acaso vimos notícias alarmantes de uma série de assassinatos de lideranças políticas no norte do país. As notícias esfriaram mas isso não quer dizer o clima por lá esteja ameno agora. Há muita gente no campo marcada para morrer.
          Diz Milton Santos que "o campo moderno é obediente; a cidade, não". Isso porque "o capital físico, fixo, não se moderniza rapidamente". Por isso, a cidade ainda atrai muita gente pobre. No caldeirão urbano, produz-se também muita gente pobre, mas outra vez o grande geógrafo faz o contraponto, as cidades fortalecem o ponto de vista da produção do futuro, da produção política, provocando uma diversidade maior da produção em termos econômicos e culturais. 
          A cidade é um ente econômico menos dependente do mercado mundial e do Estado central do que o campo. Milton Santos diz que isso a torna capaz de fazer "renascer a Nação". O termo é forte. Quem tem coragem em falar de Nação hoje em dia? 
          Quando o Estado é incapaz de administrar em conjunto os pedaços do território, há uma fragmentação dessa Nação. Como essa administração em conjunto é impossível ao Estado, cria-se uma desordem no território. A cidade é uma desordem.
          Contudo, e esse é o sopro entusiasta de Milton Santos, existe a possibilidade de ordem econômica, cultural e política nas cidades, e ela reside no olhar em direção às múltiplas formas do futuro.
          Tenho uma visão otimista,
creio que a Nação é despedaçada sobre o território como um todo
e se refugia nas grandes cidades.
É uma construção da vontade de ser cidadão
e que deverá se materializar em participação política,
em uma retomada do processo de construção nacional.
Essas são as forças centrípetas.

          Três anos depois dessa entrevista, leio um artigo (O Globo, dia 11/07/11) de um cronista espanhol do jornal El país, Juan Arías, em que ele pergunta "Por que os brasileiros não reagem?". "Nem sequer os jovens, trabalhadores ou estudantes, manifestaram até agora a mínima reação ante a corrupção daqueles que os governam."
          O artigo toma a corrupção como eixo: um vereador que ganha dez vezes, mais, um deputado que ganha cem vezes mais que um professor; dois ministros demitidos; aposentadorias nababescas de alguns; cidadãos desassistidos etc. Por que a cidade não se revolta?
          Ele relembra as passeatas pelas "Diretas já", as marchas contra o ex-presidente Collor e diz que o Brasil hoje está mudo; as únicas causas que levam milhões às ruas, diz Arias, são o homossexualismo e a religião evangélica. Ele fala em "brasileiros"; implicitamente ele pensa em Nação, mas pensando nas palavras iniciais de Milton Santos sabemos que os cidadãos se concentram nas cidades. O que aconteceu com as forças centrípetas da cidade?
          O que nos cala é a ignorância do futuro. Porém, a impossibilidade de concebê-lo, de olhar à frente, talvez esteja na falta de um olhar para os lados. Educação é isto. Compreender as condições do que nos envolve e, com prudência, seguir.
          Vamos olhar ao redor?

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